Pergunta que a gente repete, como se essa fosse uma via de mão única, como se o desgaste fosse unilateral.
Esse questionamento chega a ser tão frequente quanto Messi na frente do gol. A resposta, no entanto, não surge como passe de um craque: é construção coletiva. Não basta cuidar do filho de alguém por umas horinhas enquanto a mãe (ou a tia, ou a avó, ou a irmã) descansa ou resolve aspectos de sua vida cotidiana. Não basta uma rede de apoio, construída por laços de afeto ou contratada, para dar "aquela ajuda". E é permeando esse cenário que elaboro as reflexões dessa conversa.
Todos nós dependemos de cuidado em diferentes intensidades nas diversas fases da vida.
Quem fala sobre cuidado?
Na pauta em torno da deficiência, a narrativa sobre o cuidado costuma ser dominada pela perspectiva de quem cuida. Isolamento, solidão, sobrecarga, dependência financeira são aspectos importantes trazidos por quem cuida.
A gente se acostumou a debater a sobrecarga das cuidadoras, o que é um avanço, mas não se dá conta que também há sobrecarga para quem é cuidado. Esse é um reflexo do lugar que, historicamente, é dado às pessoas com deficiência: o de coadjuvantes da própria história.
Nessa relação, quem é cuidado também se desgasta nas inúmeras negociações, no esgotamento emocional, nas dependências desnecessárias e até nas violências. Mas a gente só presta atenção a isso se considerar que quem é cuidado é uma pessoa, um sujeito, e não um objeto da ação benevolente e abnegada de quem cuida.
Por isso, promover uma discussão sobre cuidado comprometida com o combate ao capacitismo significa abolir a assimetria de poder entre quem cuida e quem é cuidado e colocá-los lado a lado na construção de caminhos de emancipação e produção de vida digna.
Dependência é condição humana
Todos nós dependemos de cuidado em diferentes intensidades nas diversas fases da vida. Isso aproxima pessoas com e sem deficiência, porque entendemos que pessoas com deficiência não são exceção ou casos excepcionais. Pessoas com deficiência vivenciam o que é, ou certamente será, um ou mais momentos na vida de qualquer pessoa.
"É preciso construir sociedades que acomodem a nossa dependência inevitável com dignidade e vida plena tanto para quem é cuidado quanto para quem cuida". - Eva Kittay, filósofa e professora
O que podemos fazer?
Que tal começar questionando a familiarização e a feminização do cuidado?
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